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Submissão [Michel Houellebecq] #resenha

À la française 7 de março de 2016 Aline T.K.M. Nenhum comentário


Vendido como “o livro mais polêmico do ano” em 2015, Submissão não só causou burburinho pelo tema e pelas declarações polêmicas que o autor vez ou outra faz, mas também por ter chegado às livrarias francesas no dia do atentado à sede do jornal Charlie Hebdo, massacre que resultou em doze mortes em janeiro do ano passado.

Mas não parou por aí. Entre os leitores, o burburinho também teve a ver com aquela velha questão de expectativa vs. realidade. A (nem tão feliz) comparação com distopias como 1984, de George Orwell, faz a gente esperar uma crítica implacável ao Islã, algo como o retrato de uma espécie de ditadura imposta ao Ocidente que castiga duramente os que se rebelam contra ela. Só que Submissão não segue esse caminho. A pegada é outra, não menos genial e conduzida com inteligência.

O ano é 2022. Mohammed Ben Abbes, líder da Fraternidade Muçulmana, é eleito presidente da França. Moderado e carismático, o político não lança mão de violência nem de atitudes de general, mas apenas de grande astúcia. Notadamente estrategista, a presidência islâmica não demora a se movimentar para a anexação de países árabes à Europa – um caminho rumo à construção de uma espécie de “Império Romano”, pensando em dominação, mas desprovido de massacres.


Une parfaite journée parfaite [Martin Page] #resenha

À la française 3 de novembro de 2015 Aline T.K.M. Nenhum comentário


Ele, o mais anônimo dos anônimos, sobrevive à rotina entediante do escritório, cultiva um jardim no interior do apartamento, é sozinho e contrata atores para representar mulher e filho nas festas da empresa, além de passar as férias dentro de um elevador. Sua principal ocupação? Passa os dias a tramar tentativas de suicídio. Seja com um revólver guardado na cabeceira da cama, com uma corda para enforcar-se, com a lâmina do barbeador, com sua dose diária de ansiolíticos e barbitúricos, com um verdadeiro campo minado escondido sob o piso do apartamento, ou mesmo eletrocutado.

Aos vinte e tantos anos, ele seria mais ou menos um homem como qualquer outro, não fosse o fato de ter sido diagnosticado portador de um tubarão que nada dentro de seu corpo. Fonte de mal-estar, ele pode sentir o imenso corpo e as barbatanas que o arranham por dentro. Sorte que frequentemente ele se depara com um quarteto de músicos mexicanos que interpretam, a sua maneira, sucessos do pop-rock de todos os tempos.

Esta introdução já é suficiente para convencer os leitores de que Une parfaite journée parfaite é um daqueles pequenos tesouros literários que merecem ser lidos o quanto antes. Estou errada? Dizer que o livro é de autoria do Martin Page, bem, aí já vira covardia. Sou suspeitíssima para falar – o francês é um dos meus autores preferidos – mas o cara sempre presenteia o leitor com tramas peculiares e personagens deliciosamente excêntricos.


Zazie no Metrô [Raymond Queneau] #resenha

Cosac Naify 30 de setembro de 2015 Aline T.K.M. Nenhum comentário


Uma pré-adolescente espevitada e muito, muito desbocada, passa dois dias na Paris da década de 50. Apesar de algumas frustrações – contrariando o título, ela não anda de metrô –, a garota vive momentos aventurescos em uma “pequena grande” jornada pela cidade e pela vida.

O parágrafo acima é apenas o plot da história de Raymond Queneau. Zazie no Metrô, célebre romance e marco literário na época em que foi lançado, está a caminho de completar seis décadas de sua primeira publicação e isso sem deixar de conquistar leitores mundo afora.

Para passar uns dias curtindo o namorado em Paris, Jeanne Lalochère deixa a filha Zazie aos cuidados do tio Gabriel. Empolgada, Zazie não vê a hora de andar de metrô pela primeira vez. Justo naquele dia, porém, o metrô está em greve.


Primavera de cão [Patrick Modiano]

À la française 6 de julho de 2015 Aline T.K.M. 4 comentários


Primavera de cão conclui a Trilogia Essencial do francês Patrick Modiano, laureado com o Nobel de Literatura em 2014. Mais uma vez realidade e ficção se fundem, resultando num romance habitado por personagens – ou pessoas reais – evasivos e, por isso mesmo, intrigantes. Em minha opinião, o melhor da trilogia, que é composta por volumes independentes entre si.

As recordações do narrador têm início na primavera ensolarada de 1964; ele tinha então dezenove anos. Está com a namorada num café na place Denfert-Rochereau quando por acaso conhece o fotógrafo Francis Jansen, que aproveita para clicar o casal para uma reportagem de uma revista americana.


Flores da ruína [Patrick Modiano]

À la française 4 de julho de 2015 Aline T.K.M. 4 comentários


Segundo volume da Trilogia Essencial de Patrick Modiano (Nobel de Literatura 2014), Flores da ruína dá continuidade ao passeio pelas memórias do autor-narrador-protagonista, naquele mesmo mix de ficção e autobiografia que vimos no volume anterior, Remissão da pena. Aliás, todos os três romances da trilogia são independentes, podendo ser lidos de forma avulsa e em qualquer ordem.

Antes de tudo, comparo Flores da ruína a uma caminhada sem rumo numa tarde ensolarada. À medida que passamos por lugares e vemos coisas e pessoas, lembramo-nos de eventos do passado, de pessoas que passaram por nossas vidas e só deixaram um rastro borrado. Então, ao dobrar uma esquina e adentrar outra rua, uma lembrança diferente nos toma de assalto, mudando-nos o rumo do pensamento. Pois é desta maneira que se desenrola o livro: um lugar, um fato, e de repente toda uma rede de lembranças surge de forma repentina, para então se desfazer e se deixar encobrir por outras lembranças de outras coisas e tempos.


Ronda da Noite [Patrick Modiano]

À la française 8 de junho de 2015 Aline T.K.M. Nenhum comentário


Segunda Guerra Mundial. Ocupada pelos nazistas, Paris é mórbida, sombria; é este o cenário em que um jovem sujeito se arrisca em um jogo que já sabe perdido: trabalha para a Gestapo e para a Resistência, simultaneamente.


Remissão da pena [Patrick Modiano]

À la française 8 de abril de 2015 Aline T.K.M. 4 comentários


Em forma de romance, a autobiografia do francês Patrick Modiano, Nobel de Literatura 2014, retrata uma infância repleta de lacunas, vivida nos arredores da Paris pós-Segunda Guerra.

Primeiro de uma trilogia composta por Flores da ruína e Primavera de cão (lançados em breve pela ed. Record), Remissão da pena apresenta o pequeno Patrick – ou Patoche, como é carinhosamente chamado – e seu irmãozinho, que vivem em um vilarejo próximo de Paris sob os cuidados de amigas de sua mãe.


Tarântula [Thierry Jonquet]

À la française 17 de novembro de 2014 Aline T.K.M. 4 comentários


Um renomado cirurgião, um assaltante foragido, uma mulher prisioneira e submissa, um rapaz acorrentado num porão escuro. Como é que a existência desses indivíduos poderia, em dado momento, se tocar? Pois isso eu lhes digo: da mais louca e improvável das maneiras.

Thriller que inspirou o filme A pele que habito, do Almodóvar, Tarântula promete manter o nível de tensão nas alturas. Mantida presa em um dos quartos de uma mansão, Ève é objeto do ódio e do desejo de vingança de Richard Lafargue, que tem no sofrimento dela seu único apaziguamento. Em paralelo, acompanhamos o misterioso sequestro do jovem Vincent que, acorrentado em um cativeiro escuro, é mantido em condições subumanas; pouco a pouco, sequestrado e sequestrador avançam em uma estranha relação. Para completar, ainda temos Alex, o criminoso que precisa a todo custo arrumar uma maneira de sumir do mapa; e também Viviane, filha do Doutor Lafargue, que vive em um hospício.


O 6º Continente [Daniel Pennac]

À la française 11 de novembro de 2014 Aline T.K.M. 2 comentários


Em suas 160 páginas, O 6º Continente traz dois textos de Daniel Pennac: a novela curta "Antigo doente dos hospitais de Paris", e a peça teatral "O 6º Continente", que dá nome ao livro.

Ao contar a história de uma família que, em um século, alcança imensa fortuna mas se torna fonte da maior poluição já vista no planeta, a peça "O 6º Continente" faz representação ferina da burguesia inserida numa fábula atual sobre os problemas ambientais.


O corpo tem suas razões [Thérèse Bertherat, com a colaboração de Carol Bernstein]

À la française 1 de outubro de 2014 Aline T.K.M. 12 comentários


"Quanto mais fraco for o corpo, mais ele manda; quanto mais forte for, mais obedece", dizia Jean-Jacques Rousseau.

Poucas vezes um livro de não ficção foi tão importante para minha vida como O corpo tem suas razões.

Fui conquistada desde a introdução do livro, que prepara muito bem o leitor para a avalanche de informações e orientações que encontrará no decorrer das páginas. A partir das experiências da autora, começamos a entender a importância de ouvir o que o corpo tem a dizer, para que seja possível libertá-lo e passar a ser dono – de verdade – dele.


De víbora na mão [Hervé Bazin]

À la française 23 de setembro de 2014 Aline T.K.M. 2 comentários


Um dos mais célebres romances infantojuvenis da literatura francesa, De víbora na mão é ainda hoje referência quando se fala em infância penosa. A mãe perversa, o pai submisso e negligente, as crianças martirizadas e a troca constante de preceptores compõem o quadro do fracasso doméstico da família Rezeau.


O Sal da Vida [Françoise Héritier]

À la française 21 de julho de 2014 Aline T.K.M. 8 comentários


"Num belo dia de verão, se assim posso dizer, pois fazia um mau tempo, recebi um cartão-postal da Escócia. Alguém de quem gosto demais, o professor Jean-Charles Piette, “Monsieur Piette”, como eu o chamo intimamente, mandava-me algumas palavras da ilha de Skye. O cartão começava assim: ‘Uma semana roubada de férias na Escócia.’"

Assim começa O Sal da Vida, best-seller da antropóloga francesa Françoise Héritier. Porque a palavra “roubada” lhe salta diante dos olhos, a autora tece uma carta-resposta explicando ao amigo que, ao contrário de “roubar” suas férias, é sua própria vida o que ele rouba todos os dias. Ao se entregar exaustivamente ao trabalho, Monsieur Piette tira de si mesmo o tempo de desfrutar das pequenas coisas prazerosas da vida – ainda que o trabalho lhe seja também uma fonte de prazer.

Segue-se então uma longa lista em forma de monólogo – com duração de vários dias, inclusive –, em que a autora enumera pequenas coisas que conferem graça e leveza à vida, celebrando o existir, pura e simplesmente. Atos, acontecimentos e sentimentos diminutos que são parte do cotidiano e que, tantas vezes, não aguçamos os sentidos para percebê-los ou simplesmente não nos damos tempo de aproveitá-los de forma plena. Coisinhas que dão o tempero, o sal da vida. Que fazem toda a diferença.

Ao nos colocarmos no lugar do destinatário dessa resposta, tão simples e direta, percebemos uma verdade incontestável: o equilíbrio é o grande segredo da felicidade. Ou, pelo menos, um deles. E é com tantas coisas em tão poucas páginas que a autora nos conta isso.

Apesar da mensagem universal, O Sal da Vida pode ter um sentido particular a cada leitor. Em todos e em cada um dos casos, o livro é uma lufada de frescor. É também, e principalmente, uma intimação a repensar a maneira – e o ritmo – como temos levado nossos dias.

LEIA PORQUE...
Com uma mensagem superpositiva, o livro fala de pequenos prazeres cotidianos e, como diz na capa, do que faz a vida valer a pena. E importante: sem ser um livro de autoajudanada contra, mas eu não curto.

DA EXPERIÊNCIA...
Para ler numa “sentada” só e terminar as 108 páginas enxergando a vida de outra maneira. Pode não operar milagres, mas dá um colorido especial ao dia.

FEZ PENSAR EM...
Sabe os pequenos prazeres da Amélie Poulain? Então, algo mais ou menos por aí...


Título: O Sal da Vida
Título original: Le Sel de la Vie
Autor(a): Françoise Héritier
Tradução: Maria Alice A. de Sampaio Dória
Editora: Valentina
Edição: 2013
Ano da obra: 2012
Páginas: 108
Onde comprar: Saraiva | Fnac | Submarino

Todas as manhãs do mundo [Pascal Quignard]

À la française 2 de maio de 2014 Aline T.K.M. 4 comentários

Retratando – de maneira romanceada – duas figuras históricas da música clássica, Sainte Colombe e Marin Marais, Todas as manhãs do mundo aborda a delicada relação entre mestre e discípulo.

Século 17. O ano é 1650: época de Luís XIV, das perucas elaboradas e do excesso de pompa. O senhor de Sainte Colombe, viúvo e exímio tocador de viola da gamba (nome italiano que significa “viola de perna”), leva uma vida austera no campo ao lado das duas filhas. De poucas palavras, tem dificuldade em expressar seus sentimentos e frequentemente é tomado por crises explosivas de cólera. Para ele, a música “de verdade” só é possível se tiver como base a dor e o sofrimento; desta maneira, abomina a música feita para o entretenimento do rei, bem como os próprios músicos da corte.

O jovem Marin Marais é o extremo oposto disso. Ligado à Corte, alguns reveses fazem com que o jovem e talentoso músico busque Sainte Colombe e lhe peça que o aceite como discípulo. O reconhecimento que têm os músicos do rei lhe agrada, fazendo com que não seja bem recebido logo de sua primeira visita àquele que viria a se tornar seu mestre.

Realidade e ficção se misturam em um romance que tem na música um importante pano de fundo para a relação entre os dois músicos, o verdadeiro centro de toda a trama. O reduzido número de páginas revela uma história pautada no sofrimento e nas variadas dimensões do amor. Longe da superficialidade, os personagens são densos e carregam dores complexas, cada qual a sua maneira.

Ainda que coadjuvantes, as filhas de Sainte Colombe exercem papel importante ao longo da trama. Inclusive, envolvendo o jovem Marin Marais – que também na vida real foi discípulo de Sainte Colombe. Uma das personagens mais interessantes, Madeleine (a filha mais velha) nos mostra como podem ser devastadoras as consequências de um amor intenso acompanhado da desilusão.

A fluidez da narrativa – preocupada em situar o leitor, mas sem ser excessivamente descritiva – faz com que nos concentremos, sobretudo, nos sentimentos dos personagens. Sentimentos que também são experimentados pelo leitor: impossível não compartilhar da emoção, e também da frustração, que caracterizam os “encontros” de Sainte Colombe com a esposa falecida.

Todas as manhãs do mundo fala de maturidade e de solidão, de arrependimento e também de amor. E mostra a dor como a grande força motriz de tudo.

LI EM FRANCÊS


Li para o curso de francês e foi uma leitura relativamente simples. Recomendo para quem já tem algum domínio do idioma – certas nuances sentimentais da trama podem passar despercebidas caso a leitura não se faça de forma fluida.

Edição lida: Tous les matins du monde, de Pascal Quignard, Gallimard (Collection Folio nº 2533), 1993.
Onde comprar em francês: Livraria Cultura


LEIA PORQUE...
Traz personagens reais, embora a trama seja romanceada. Além disso, é interessante ver como a música – com todo o seu aspecto intangível – nos é mostrada ao longo das páginas, ganhando cor e forma impensáveis.

DA EXPERIÊNCIA...
Ainda que não seja um livro de interesse universal, vale a pena pela beleza e sensibilidade da trama.

Em tempo: recomendo que assistam à adaptação, que leva o mesmo nome do livro e tem direção de Alain Corneau. Depardieu pai e filho interpretam Marin Marais em diferentes momentos da vida.

FEZ PENSAR EM...
Como discutido na aula de francês, é possível traçar um paralelo bastante interessante entre alguns momentos da trama e o mito de Orfeu e Eurídice – prestem atenção em Sainte Colombe e seus pequenos rituais em busca da esposa.

Título: Todas as manhãs do mundo
Título original: Tous les matins du monde
Autor(a): Pascal Quignard
Tradução: Pedro Tamen
Editora: Rocco
Edição: 1993
Ano da obra: 1991
Páginas: 94
Onde comprar: Estante Virtual

O Gato do Rabino – vol. 3: O Êxodo [Joann Sfar]

À la française 17 de março de 2014 Aline T.K.M. 4 comentários


Em O Êxodo, terceiro volume da série em HQ O Gato do Rabino, assistimos ao casamento da jovem Zlabya e acompanhamos o casal em sua lua de mel em Paris. O velho rabino, pai da moça, também os acompanha, além do gato falante (que ainda não recuperou o poder da fala).

Repleta de contratempos, a estada em Paris não poderia ser mais divertida. Pelo menos para nós, leitores. Já os personagens vivem consideráveis momentos de dúvida e até angústia, a começar pelo velho rabino, que se recusa a ficar hospedado na casa dos pais do genro. Só que, ao mesmo tempo, é complicado para o rabino dirigir-se a um hotel e jantar em um restaurante em pleno Shabat judaico – sábado, dia de descanso judaico em que várias atividades são proibidas de ser realizadas ao longo de todo o período. Transgredir as regras acaba sendo a única opção do velho.

Zlabya não pode se impedir de comparar-se às francesas, e isso a deixa angustiada. Já o gato, bom, este arranja um companheiro com quem conversar: um cachorro bem simpático, que não cessa de abanar o rabinho – o que deixa o felino um tanto intrigado.

O Êxodo é, até o momento, o mais cômico de todos os volumes da série. Desde a estupefação do velho rabino com Paris, cujos habitantes, coitados, nem ao menos se encontram próximos ao mar; até as aventuras e conversas do gato e do cachorro – dupla infalível.

Ainda, vale a pena atentar para as reflexões do rabino quanto aos judeus com os quais ele se depara em Paris, que parecem diferentes do que ele está acostumado. Reflexões que o acompanham e se tornam ainda mais importantes ao agir de maneira contrária às regras do Shabat, fazendo com que questione alguns conceitos da religião.

Humor, profundidade e ironia são entregues ao leitor na forma de um texto cheio de significado – sem jamais abandonar a simplicidade – e através de desenhos cujos traços exibem beleza e mesmo sensualidade.

Terminar o volume já ansiando pelo próximo é destino certeiro dos leitores.

LI EM FRANCÊS


Da mesma forma que o primeiro e segundo volumes da série, este também traz leitura simples. Indico sem medo para os intermediários/avançados, que leem bem sem precisar recorrer ao dicionário o tempo todo.

Edição lida: Le Chat du Rabbin – 3. L’Exode, de Joann Sfar, Dargaud (collection Poisson Pilote), 2003.
Comprar em francês: Livraria Cultura
LEIA PORQUE...
A série continua genial, as ilustrações são belíssimas e os personagens são engraçados e, ao mesmo tempo, se dedicam seriamente à reflexão. Além de que foi bem divertido ver os personagens em Paris.

DA EXPERIÊNCIA...
Foi o melhor volume da série até agora! Fiquei com a empolgação renovada para ler os próximos. O único “porém” é que para continuar lendo a série devo esperar que a biblioteca adquira os próximos volumes, ou então comprá-los importados eu mesma. No Brasil, até onde sei, a série parou de ser editada no terceiro volume.

FEZ PENSAR EM...
Paris nas histórias. É incrível como, mesmo sendo cenário batido em muitas tramas, sempre são reveladas facetas diferentes da capital francesa.



Título: O Gato do Rabino – vol. 3: O Êxodo
Título original: Le Chat du Rabbin – 3. L’Exode
Autor(a): Joann Sfar, (colorido por) Brigitte Findakly
Tradução: André Telles
Editora: Zahar
Edição: 2006
Ano da obra: 2003
Páginas: 48

Vídeo-review: Gataca [Franck Thilliez]

À la française 21 de fevereiro de 2014 Aline T.K.M. 14 comentários

Um suspense com ares de policial que leva o leitor em uma viagem pelo universo da genética e da Evolução, revelando a ligação intrínseca da violência com o ser humano. Este é Gataca, do francês Franck Thilliez. Junto com A Síndrome E, forma um díptico que tem a violência como tema.

http://youtu.be/GmuZ4w14Hj4
Tocou no vídeo: Love will tear us apart – Joy Division

POST RELACIONADO:
Review: A Síndrome E



Título/Título original: Gataca
Autor(a): Franck Thilliez
Tradução: Mauro Pinheiro
Editora: Intrínseca
Edição: 2013
Ano da obra: 2011
Páginas: 432
Onde comprar: Americanas.com | Submarino | Livraria Cultura

A Loja dos Suicidas [Jean Teulé]

À la française 10 de janeiro de 2014 Aline T.K.M. 8 comentários


Uma trama simples com uma mensagem tão óbvia quanto naïve. Essa é a primeira impressão que se tem do livro A Loja dos Suicidas, do francês Jean Teulé.

Uma família meio macabra, à la Addams, dedica-se a cuidar de uma loja de produtos para suicídio. Eles mesmos com tendência suicida, só não cumprem o destino que vendem porque caso todos os membros da família se suicidassem não haveria quem tocasse a loja por eles.

Os dois filhos adolescentes, Vincent e Marilyn, seguem o perfil depressivo e suicida dos pais; já o caçula caminha em sentido totalmente oposto. De riso fácil e extremamente otimista – hello, Poliana? –, o pequeno Alan faz de tudo para mudar a natureza da própria família, irritando de tal maneira os pais e irmãos a ponto de ser enviado para passar uma temporada numa escola de camicases.

Se até a metade a história tem ar bobo, caricato demais e sem verdadeira identidade, logo após somos cativados por passagens reflexivas, dotadas até de algum teor poético. A partir de então, o enredo mostra certo significado que ultrapassa a linha do óbvio.

O humor negro é uma constante na narrativa e, igualmente, na rotina do casal Tuvache e seus três rebentos – todos eles nomeados a partir de suicidas famosos: Vincent (Van Gogh), Marilyn (Monroe) e Alan (este vale a pena conferir no livro: a história por trás do nome é bem curiosa). Vez ou outra, uma comicidade meio forçada dá as caras, mas nada que chegue a níveis irritantes. Vale ressaltar também os produtos e kits de suicídio vendidos na loja dos Tuvache, que são até bem criativos.

A Loja dos Suicidas poderia ser apenas mais uma leitura regular. Contudo, o final traz uma importante reviravolta e... reviravoltas são legais. Ao prometer o esperado, a trama dá uma rasteira inesperada no leitor e o deixa boquiaberto nas linhas finais do romance. Digamos que a surpresa é suficiente para repassarmos toda a história mentalmente a fim de encontrar alguma pista que indique uma justificativa e o significado real do desfecho.

E o melhor: a obviedade e a ingenuidade precipitadamente atribuídas à trama são colocadas em dúvida. Antes regular, o livro vira bom e, graças ao final inesperado, terminamos com um materialzinho para algumas reflexões pós-leitura.

LEIA PORQUE...
É simples, rapidinho de ler, tem algo de humor negro e é diferente do que vemos por aí. Além disso, tem um final que realmente não é esperado.

DA EXPERIÊNCIA...
Uma boa recomendação é não esperar por personagens profundos e altamente desenvolvidos, nem uma trama complexa. Um livro bom, que tem suas particularidades.

FEZ PENSAR EM...
A Pequena Loja de Suicídios, filme de animação baseado no livro. Lançado em 2012, tem direção de Patrice Leconte.

Ainda quero assisti-lo – dá para ver online em alguns sites e até no YouTube – e creio, sinceramente, que a adaptação deve ser bem mais interessante que o livro. De cara, já conquista pelo visual. Confiram o trailer:



Título: A Loja dos Suicidas
Título original: Le Magasin des Suicides
Autor(a): Jean Teulé
Tradução: Cordélia Magalhães, Graziella Marraccini
Editora: Ediouro
Edição: 2010
Ano da obra: 2007
Páginas: 144


Persépolis [Marjane Satrapi]

Companhia das Letras 18 de dezembro de 2013 Aline T.K.M. 17 comentários

Baseado na história real da própria Marjane Satrapi, Persépolis supera de longe muito romance de formação por aí.

A autobiografia em HQ começa com uma Marjane de dez anos de idade nascida em Teerã e que sonha com tornar-se profeta. A Revolução Islâmica de 1979, com a queda do regime monárquico do xá Reza Pahlevi (que apoiava o Ocidente e reprimia ferozmente os opositores ao regime, além de ser contra alguns princípios tradicionais islâmicos) e o surgimento de uma república islâmica sob o poder do aiatolá Ruhollah Khomeini (que era contra os EUA e Israel), faz com que Marjane se veja obrigada a usar o véu e estudar em uma sala só de garotas.

Universidades são temporariamente fechadas; para continuar a ouvir suas bandas ocidentais preferidas, a garota tem de comprar suas fitas no mercado negro. Ter na parede um poster de uma banda de rock ocidental só foi possível porque seus pais o trouxeram escondido de uma viagem ao exterior – a mãe escondeu o poster costurado dentro do forro do sobretudo de seu pai.

Mais que simples pano de fundo, os eventos históricos determinam os rumos da vida da protagonista, seu crescimento e a formação de sua identidade. Ao abordar a Revolução Islâmica e, mais adiante, a guerra Irã-Israel, o livro revela o drama do período pelos olhos de uma jovem em ebulição, vivendo sua própria revolução pessoal. A ironia e um humor não óbvio – ainda assim evidente – também são ingredientes amplamente utilizados ao longo das mais de trezentas páginas.

Os desenhos de traços simples, sem cores, e o texto perspicaz mostram uma garota que conhece a guerra ainda criança (tendo perdido amigos e familiares), e que por causa dela é mandada por seus pais à Áustria, aos catorze anos, para continuar seus estudos longe do ambiente repressivo de seu país.

De adolescente punk à namorada de um cara que depois se revela homossexual, Marjane passa por diversas transformações, que incluem um surto de crescimento, quadris mais largos e uma pinta no rosto. Foi a “criança nova da classe”, foi simpatizante do anarquismo, foi inquilina de uma mulher chata com cara de cavalo...

Além das descobertas e dificuldades, também marca presença um recorrente sentimento de solidão. O início da adolescência na Áustria, o retorno ao Irã e, posteriormente, a ida à França; a juventude da protagonista é pontuada por certo ”choque” entre as culturas oriental e ocidental. Esse estranhamento experimentado pela garota caminha em paralelo ao estranhamento do próprio leitor ao se deparar com as restrições e a repressão iranianas, numa (inevitável) comparação com o estilo de vida ocidental. O mais interessante é ver Marjane crescer e desenvolver uma visão própria de mundo, que se pode considerar privilegiada graças à educação menos ortodoxa que recebeu de sua família, por sua vez politizada e mais liberal.

Persépolis traz muito de História, tradições e cultura. Com trama e personagens sagazes, apresenta uma narradora-protagonista naturalmente hilária, questionadora e direta. Marjane conversa com o leitor – a personagem desenhada muitas vezes olha nos olhos de quem a lê –, envolvendo-o nos acontecimentos e deixando que faça parte de sua história pessoal.

Se fosse definir Persépolis em uma única frase, seria esta: é uma das coisas mais originais que já li.

LI EM FRANCÊS


Leitura simples, mas recomendaria somente a partir de um nível mais autônomo para não perder a fluidez e o humor das falas.

Edição lida: Persepolis, de Marjane Satrapi, Éditions L’Association, collection Ciboulette, 2007.

LEIA PORQUE...
A resenha é autoexplicativa neste ponto, mas, caso necessário, disponho-me a ser redundante: o livro é muito bom, coisa que não é deste mundo. Só na França, vendeu mais de 400 mil exemplares.

Um pequeno parêntese: A jornada de Marjane, do final da infância à idade adulta, é dividida em quatro volumes que podem ser adquiridos separadamente ou em um único volume completo – o que, em minha opinião, é mais vantajoso. E aproveito para lembrar que tem adaptação para o cinema (assisti na época do lançamento, há uns anos), tão imperdível quanto a HQ.

DA EXPERIÊNCIA...
Conheço pouco e nunca fui muito ligada a quadrinhos; meu contato com o gênero é recente e se resume às opções em francês disponíveis na biblioteca da Aliança Francesa. No entanto, a experiência marcante de ler Persépolis me fez lembrar uma HQ que li, em português, há uns bons anos e que considero uma leitura categoricamente obrigatória: Maus, do Art Spiegelman, que aborda o Holocausto.

FEZ PENSAR EM...
Uma garrafa no mar de Gaza – por também mostrar o choque entre culturas em meio a conflitos no Oriente Médio.

Título: Persépolis (Completo)
Título original: Persepolis
Autor(a): Marjane Satrapi
Tradução: Paulo Werneck
Editora: Companhia das Letras
Edição: 2007
Ano da obra: 2000-2003 (4 volumes)
Páginas: 352


A Síndrome E [Franck Thilliez]

À la française 9 de dezembro de 2013 Aline T.K.M. 7 comentários


E se a violência no âmago de um ser humano pudesse ser ativada estimulando seu cérebro sem que o próprio indivíduo se desse conta?
Best-seller em seu país de origem, o thriller francês traz assassinatos frivolamente executados enquanto caminha pelas vias labirínticas da psique humana.

O mistério começa quando Lucie Henebelle, tenente de polícia na cidade de Lille, recebe um pedido de socorro: seu ex-namorado ficou cego depois de assistir a um curta-metragem anônimo, comprado do filho de um colecionador falecido, e sugere que isso se deva à existência de conteúdo escondido na película. Em paralelo, o comissário Franck Sharko, então analista comportamental da Divisão de Repressão à Violência, é convocado para seguir as investigações decorrentes da descoberta de cinco cadáveres cujas mãos, dentes e olhos foram arrancados, além do crânio serrado e cérebro desaparecido.

Basta um telefonema esquisito e não demora muito para que Lucie e Sharko estabeleçam alguma conexão entre os dois eventos. Mensagens subliminares, estimulação cerebral, pitadas de neuromarketing e histeria coletiva são alguns dos ingredientes da trama, sem esquecer os crimes violentos e a relação com a sétima arte. Inspirador.

À medida que se conhecem melhor, Sharko e Lucie percorrem distâncias (Egito, Bélgica, Canadá, e mesmo o interior da própria França) atrás de pistas promissoras que envolvem hospitais e orfanatos, e investigam sobre um cineasta visionário em um projeto tão bizarro quanto cruel datado dos anos 50. Ainda, deparam-se com a chamada “síndrome E” e com vislumbres da origem da violência.

Ao lado do mistério e das investigações, acompanhamos o desenvolvimento dos protagonistas que, por sua vez, enfrentam crises e demônios pessoais. Traumatizado pela perda da mulher e filha, Sharko é atormentado pela “presença” de uma garotinha fissurada por marrons-glacês e molho coquetel; já Henebelle sente a carreira distanciá-la cada vez mais das filhas pequenas. Tempero intrigante para a história, não fosse o fato de que A Síndrome E faz parte de uma série cujos títulos anteriores não foram lançados no Brasil – a impressão é a de que, nas entrelinhas, espera-se que o leitor já conheça algo dos personagens. Talvez isso explique o porquê de termos de nos contentar com meros flashes do passado dos personagens em questão, em especial o de Sharko.

O desfecho deliciosamente angustiante nos leva a perguntar, ainda pensando nesse assunto de série, se o próximo volume, Gataca, traz uma continuação direta do conflito que parece iniciar-se nas linhas finais de A Síndrome E. Pessoalmente, gostaria de acreditar numa resposta positiva.

LEIA PORQUE...
A Síndrome E une elementos diversos numa mesma trama, traz conspirações e forte presença do científico – toda a parte relacionada à neurologia –, que é o grande ponto forte do livro.

DA EXPERIÊNCIA...
Não superou tremendamente minhas expectativas, mas atendeu-as perfeitamente bem. Um bom thriller que eu recomendaria, sim.

FEZ PENSAR EM...
Laranja Mecânica; as questões relacionadas ao cérebro, comportamentos gerados a partir de modificações cerebrais que, por sua vez, seriam conseguidas por meio de estímulos externos, vez ou outra me fizeram lembrar o condicionamento a que Alex é submetido na trama de Burgess. A utilização da imagem como meio de estímulo. E ainda, o personagem que fica cego por causa do curta misterioso atende por Ludovic; mera coincidência ou não, a terapia utilizada em Laranja Mecânica chama-se “Técnica Ludovico”.

Título: A Síndrome E
Título original: Le Syndrome E
Autor(a): Franck Thilliez
Tradução: André Telles
Editora: Intrínseca
Edição: 2013
Ano da obra: 2010
Páginas: 368


O Gato do Rabino – vol. 2: O Malka dos Leões [Joann Sfar]

À la française 6 de dezembro de 2013 Aline T.K.M. 4 comentários

Na continuação do primeiro volume, tudo começa com uma carta vinda de Paris, diante da qual o rabino se vê ameaçado pela possibilidade de ser substituído e não mais ser o rabino da região. Ele precisa provar seus conhecimentos em língua francesa em um exame ditado que o deixa uma pilha de nervos. O gato falante tratará de ajudá-lo como pode, mas acaba pronunciando o nome de Deus em vão e aí... ele perde o poder da fala!

A um só tempo, acompanhamos a chegada de um jovem rabino de visita a um familiar moribundo, e a vinda do Malka dos Leões – primo do velho rabino e a grande atração do livro –, que causa alvoroço principalmente entre as amigas da jovem Zlabya. Temido e respeitado devido a histórias com ares lendários de que seria capaz de proteger mocinhas indefesas de um leão feroz – ele de fato tem um leão de estimação, nada feroz –, o Malka é dono de inegável carisma e ganha nossa simpatia desde sua primeira aparição.

O caráter espirituoso e a tensão permanente marcam o volume dois da série em HQ O Gato do Rabino. Ao passo em que acompanha certo amadurecimento psicológico do gato, o leitor quebra a cara ao se deparar com a perda da fala do astuto personagem. Entre apreensões e mal-entendidos, a resolução de um dos problemas não vem de graça; radiante, Zlabya – a quem o gato secretamente continuava a dirigir a palavra antes de perdê-la, apesar da proibição do rabino – revela ao bichano uma notícia que o deixa de pelos eriçados...

Sem poder falar e diante da tragédia iminente de perder a amada dona para um novo rival, o desfecho traz um gato que é, todo ele, olhos arregalados. Embora não surpreenda tanto quanto o primeiro livro, O Malka dos Leões mantém em pé o interesse do leitor e traz um excelente gancho para o terceiro volume da série, intitulado O Êxodo.

LI EM FRANCÊS


Bem simples de ler, dispensa o uso do dicionário para os que têm certa autonomia no idioma. Recomendado para níveis a partir do intermediário. Aos fluentes: se joguem que essa série vale a pena!

Edição lida: Le Chat du Rabbin – 2. Le Malka des Lions, de Joann Sfar, Dargaud (collection Poisson Pilote), 2002.

LEIA PORQUE...
Tal como no primeiro volume, a trama continua inteligente, e as falas, sagazes; os personagens conquistam o leitor mais uma vez. Apesar de ter perdido o poder de falar com os humanos, o gato ainda pode se comunicar com os animais, o que tornam engraçadas as interações entre ele e o leão do Malka.

DA EXPERIÊNCIA...
Ligeiro, rápido e gostoso de ler. As ilustrações presenteiam os olhos e, estas sim, continuam surpreendendo.

FEZ PENSAR EM...
Como Félix, Garfield, Frajola e outros felinos das animações, o gato (do rabino) é dotado de personalidade marcante e tem tudo para estar no mesmo patamar de seus colegas famosinhos.


Título: O Gato do Rabino – vol. 2: O Malka dos Leões
Título original: Le Chat du Rabbin – 2. Le Malka des Lions
Autor(a): Joann Sfar, (colorido por) Brigitte Findakly
Tradução: André Telles
Editora: Zahar
Edição: 2006
Ano da obra: 2002
Páginas: 48


O Gato do Rabino – vol. 1: O Bar-Mitzvah [Joann Sfar]

À la française 28 de outubro de 2013 Aline T.K.M. 5 comentários


Antes de qualquer conversa, falo aqui de uma fábula em HQ cujo protagonista é um gato que desatou a falar após ter engolido um papagaio. E, detalhe, ele não é um gato qualquer: o felino em questão é o bicho de estimação de um rabino que vive na Argélia no início do século 20, em uma comunidade de judeus sefarditas*.

Deu para notar que o coloridinho aqui é digno de atenção, não?

Só que, sendo seu proprietário um rabino, não seria ele um gato judeu? Uma vez que o bichano adquire o poder da palavra, ele se questiona se não deveria aprender o que diz a Torá e ter seu Bar-Mitzvah, que é a cerimônia de passagem à vida adulta que os garotos judeus fazem aos treze anos.

Como nunca houve outro gato a ter um Bar-Mitzvah, o rabino decide consultar um outro rabino para saber o que fazer, mas este se opõe à ideia. Então se inicia uma ardilosa e bem-humorada discussão na qual o gato argumenta que, como animal falante, deve ser regido pelas mesmas leis divinas que os homens.

Além disso, o felino está apaixonado por Zlabya, filha de seu dono, mas desde que adquiriu a fala não tem permissão para passar seus dias junto dela, como fazia antes de se tornar um gato falante. É que o rabino teme que o animal, agora que se põe a verbalizar, possa conduzir sua filha a caminhos nada virtuosos.

O francês de origem judaica Joann Sfar coloca falas poéticas e astutas na boca do gato, que de maneira um tanto filosófica discute o judaísmo e contesta muitos de seus preceitos. Com ilustrações dotadas de personalidade, texto inteligente e com humor irônico, e sem jamais menosprezar a cultura judaica (aliás, é bem o contrário), o gato e seu dono, o rabino, têm seus laços lindamente fortalecidos a partir dessas conversas e questionamentos.

Com a troca de ideias e esclarecimentos, e uma observação mais apurada, o gato acaba por perceber o erro de julgar alguém antecipadamente, e começa a entender o exercício da tolerância.


*Judeus sefarditas: judeus descendentes das comunidades judaicas da Península Ibérica estabelecidas no período medieval, e depois dispersas por várias regiões.

LI EM FRANCÊS


Sim, eu li O Gato do Rabino (vol. 1) em francês! E devo dizer que foi uma leitura muito rapidinha, simples e mais interessante por ser no idioma de origem. Não utilizei o dicionário – para ser exata, usei-o apenas uma vez e foi para uma palavra específica relacionada ao judaísmo.
Recomendo aos que estão entrando no nível intermediário do idioma, e arrisco mesmo a recomendar aos mais iniciantes.

Edição lida: Le Chat du Rabbin – 1. La Bar-Mitsva, Dargaud (collection Poisson Pilote), 2002.

LEIA PORQUE...
Longe de ser infantil, O Gato do Rabino conquista pela ironia, pela crítica na forma do felino. É também uma homenagem à cultura judaica e aos pintores argelinos – através das ilustrações vistosas e, ao mesmo tempo, de traços simples.

O primeiro álbum da série vendeu mais de 200 mil exemplares na França; ganhou o Eisner Awards (algo como o Oscar dos quadrinhos) de melhor HQ estrangeira em 2006, além de ter sido contemplado com o prêmio do júri do Festival Internacional de HQ de Angoulême, na França, país onde a série já tem 5 volumes lançados. No Brasil, por enquanto, temos apenas até o terceiro.

E mais: O Gato do Rabino foi adaptado para o cinema pelo próprio autor. (Ainda não assisti à animação, mas pretendo.)

DA EXPERIÊNCIA...
Não sou apegada a religião de tipo algum e geralmente detesto ler livros sobre o tema. Contudo, O Gato do Rabino me atraiu por abordar esse tipo de assunto de maneira pensante, argumentativa e utilizando de ironia. Um livro que fez diferença ter lido, e olha que aqui falo apenas do volume 1.

FEZ PENSAR EM...
Na pessoinha que ainda não retornou o volume 2 à biblioteca e que está me fazendo esperar (longamente) para continuar essa história. Mas já peguei o volume 3, por via das dúvidas... – há, não contavam com minha astúcia!



Título: O Gato do Rabino – vol. 1: O Bar-Mitzvah
Título original: Le Chat du Rabbin – 1. La Bar-Mitsva
Autor(a): Joann Sfar, (colorido por) Brigitte Findakly
Editora: Zahar
Edição: 2006
Ano da obra: 2002
Páginas: 48

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